Me prendem.
Prendem os pensamentos.
Prendem os desejos, até o de libertar.
Prende-me até o sexo,
o óbvio ser atraído e tanto,
por tantas de Oxum,
Filhas suas...
Deviam me livrar de amarras, estes desejos,
mas hoje, prendem.
E preso aqui,
de frente a um Congado
onde metade já deve ter deixado seus corpos livres
para Orixás (ou o Espírito Santo) descerem e dançarem neles,
me sinto horrivelmente branco.
E branco, racional e conformado,
me deixo levar até onde iria mesmo,
Pombo branco manco e sem asas.
Até então me ver mirado por ele,
em seu olhar torto e sua boca preta e rosa.
Senhor absoluto que eu não tinha entendido até ali,
despido de palco, e montado de si mesmo,
Tizumba fazia descer Santos e Orixás,
Abençoara a rua,
Licença já dada por Exu?
Enfim, juntava em si
e de si espalhava a todos esta certeza.
Torta certeza e rosto de pai,
fitou-me como quem diz:
“dança filho, que ninguém vê que é branco”.
Quase que certo do que seu olhar me disse,
Instantes depois cantava, bravo quase:
“Todo mundo é Preto, calunga!”
E preto, dancei, mais por dentro que por fora,
mas tão certo quanto o fez Fatumbi Verger,
No total escuro da noite em Benin,
Onde a noite e a floresta diziam o mesmo,
E espalhavam esta torta certeza:
Somos todos Pretos, e Pretos dancemos!
Antes só fosse, bronco.
Antes só, fino.
Aqui, entre os que estão na origem
da bronqueza,
Sou bronco e feliz.
O lado bronco,
tosco,
enrusgado pela força,
Pelo raciocínio braçal,
do trabalho na roça,
Aprendi de meu pai.
Tosca, bronca graça,
que uso para ter amigos.
Não nas torres,
Mas aqui no mato.
Uso para ser parte das gentes,
Amigo e não doutor.
Uso... bem, não é bem isto.
Sou! Afinal, sou bronco,
Sou igual eles e não deixo o véu de tantos diplomas esconderem-me deles,
Amigos, e dos amigos, os melhores.
Mas meu pai quis ser doutor Médico,
E foi.
E como tal, escolheu casar com bailarina.
Brava, dura bailarina,
Era bailarina.
E talvez dalí, saí elaborado, ou ao menos,
afeto ao elaborar.
E me elaborei.
Aprendi estilos,
Acordei artes,
Embalado, sempre embalado,
pelos aplausos da fã-mãe, Bailarina.
Entendi tempos, povos,
Sabores, sutilezas.
Acordei gostos
(embora muitos destes, poucos sabem,
os broncos têm em grande refinamento).
Com o bronco,
escalo árvores,
carrego caminhões,
ando dias mato a dentro.
Com o que elaborei,
escrevo (nem que seja sobre as árvores que escalo!),
conto (nem que seja os casos de estrada!),
falo (nem que seja para destas coisas broncas, ensinar),
seduzo (nem que fosse para crer: os broncos serão amados!),
Convenço (nem que seja a mim mesmo!).
Só que o bronco,
Sempre está lá.
Bronco e fino,
Causo estranhezas,
e só estranhezas.
Poesia
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